sábado, 5 de novembro de 2011

Celulares versus boa educação

Editorial do jornal Dance de novembro/2011.
Celulares versus
boa educação
Uma amiga me contou e custei a acreditar: estava dançando num baile com um rapaz, deu o intervalo entre as músicas, e ali mesmo, no meio da pista e na frente dela, ele puxou o celular para conferir suas mensagens. Dá para acreditar? A que ponto que chega a grossura daqueles que, há algum tempo, neste mesmo espaço, classifiquei como os “psicopatas da tecnologia”. É a nova doença que assola o país. É claro que a moça deixou o jumento lá mesmo, sozinho, como diria uma boa letra de forró.
Nunca vou esquecer do dia, durante um festival de dança, em que fui a um shopping para almoçar com um grupo de seis pessoas. Aguardando nossos pratos, sentamos numa rodinha. O natural e esperado seria uma gostosa conversa, até porque éramos todos de dança e afinidades e assuntos nunca nos faltariam. Mas eis que cada um puxou seu celular, em silêncio, e ali ficou, de cabeça baixa, dedilhando. E eu com cara de bobo, olhando para eles. Em tom amistoso e com humor irônico fiz algum comentário. Em vão, eles não se tocam. Então naquele momento fui percebendo a triste solidão daquelas pessoas e o grau de alienação em que estão mergulhadas. O celular é apenas um objeto, frio. Reflete a alma desses seres, que vão navegando na racionalidade tecnológica e perdendo gradualmente todo sentido emocional que envolve as relações humanas. Com o tempo, se tornarão incapazes de sentir e de amar.
Agora começa a surgir um comércio dessas porcarias para, pasmem... bebês. Algumas publicações estão mostrando opiniões de especialistas que apontam o perigo disso, porque afeta o desenvolvimento mental da criança. Ela precisa de brinquedos lúdicos e educativos, inclusive que possa destruir para ver o que têm dentro e assim trabalhar sua salutar curiosidade. Isso faz parte do seu crescimento e da preparação do seu cérebro para outros avanços. O grande risco é que essa tecnologia mal aplicada e fora de hora venha a formar no futuro uma legião de imbecis, inclusive com dificuldades de comunicação verbal e escrita, porque não tiveram tempo nem oportunidade de viver a infância corretamente, em todas as suas fases. A prova é que isso já está ocorrendo com adultos. É alarmante o crescimento do número de pessoas com dificuldades para falar e escrever. Porque não foram estimuladas a pensar, desconhecem leitura e conversam cada vez menos. Basta ver os horrores que aparecem nas redações dos vestibulares, para não falar nos erros grosseiros de grafia, e olha que ali está uma suposta elite. Mas todos eles, que certamente jamais leram um livro, não se desgrudam dos seus aparelhinhos.
A falta de educação no uso de celulares que se presencia em toda parte, principalmente de gente berrando em lugares públicos e atendendo em locais inapropriados, começa a ficar preocupante e explicita também esse processo coletivo de abestalhamento, como diria em preciosa contribuição ao vernáculo o filósofo e deputado Tiririca. Eleito por eles...
Puxa, quando lembro da minha juventude em família... nas noites de verão a gente colocava cadeiras na calçada, na frente da casa, e ali ficava horas olhando a lua e conversando. Alguns vizinhos vinham se juntar. De vez em quando alguém ia buscar uma limonada geladinha e bolinhos de fubá. Havia muito diálogo. Hoje, não se conversa mais. Ah, e como uma boa conversa, quando tem qualidade, é gostosa e nos enriquece culturalmente. Gosto de sair com grandes e velhos amigos para jantar e varar horas conversando coisas interessantes e produtivas. A gente esquece do tempo, é uma delícia. Todos são muito educados, imaginem se algum vai puxar celular para conferir e-mails ou mesmo chamadas. Aí quando me reúno com uma patotinha que não sabe abrir a boca para trocar idéias, nada tem de interessante para comentar, sequer uma sacada inteligente de algum detalhe do cotidiano, lamento pelo mundinho tão restrito e pobre em que vivem.    
Não tenho a menor dúvida que essas mesmas pessoas, assim que terminam de transar, ali mesmo, na cama, pegam o celular. Antigamente era o cigarro, que agora saiu de moda e é repelido (ainda bem). Alguns carinhos e palavras de ternura depois de gozar? Não dá tempo para tanto refinamento, o celular é sempre mais importante. Contém algum tipo de urgência que acalma a psicose e carência dos seus donos. Não sei o que tanto conferem e o que deve ser tão fascinante naquela engenhoca. A julgar pelas centenas de e-mails que recebo todos os dias... 95% das mensagens se destinam ao lixo. Só pelo tema exposto já descarto, sem abrir. Então fico imaginando que essa turma lê muita abobrinha o tempo todo. E assim seus cérebros, dia a dia, vão tomando o aspecto de um canteiro repleto de inutilidades.

3 comentários:

  1. Caro jornalista Milton Saldanha!
    Que bom saber que você também brindou seus leitores deste espaço cibernético com este artigo que publicou no Jornal Dance!!!
    Apesar dos telefones portáteis terem revolucionado os meios de comunicação está ficando cada vez mais constrangedor observar a incivilidade das pessoas no uso dos seus telefones portáteis em locais públicos, como se os seus semelhantes, que estão por perto, não existissem... Para piorar mais ainda este quadro considero intolerável ver pessoas falando com a maior naturalidade dirigindo suas máquinas rodantes... É evidente que este meio de comunicação já se incorporou as fantásticas tecnologias da contemporaneidade, mas devemos ser breves e discretos ao utilizá-lo e claro desligá-lo nos cinemas, teatros, e...
    Quereria ser um cavalinho de circo para ver o que diria a respeito dos telefones portáteis o saudoso Marcelino de Carvalho, que escreveu o livro "Guia de Boas Maneiras"!!!
    Caloroso abraço! Saudações grahambellianas!
    Até breve...
    João Paulo de Oliveira
    Diadema-SP

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  2. Caro Milton.
    De pleno acordo com suas considerações.
    Também sou avessa ao uso de celulares em locais públicos e acho de extremo mau gosto e falta de educação, as pessoas que atendem o celular em voz alta, como se todos fossem obrigados a ouvir a conversa. Sempre que saio ou tomo um coletivo, deixo o meu celular no silencioso e só o atendo em locais reservados, pois não tenho o direito de perturbar ou invadir o espaço do outro.
    É preciso conscientizar as pessoas sobre o bom uso dessa tecnologia, para que ela seja uma ferramenta de real utilidade para as relações humanas.
    abços

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  3. Boa noite Milton.
    Infelizmente o celular está sendo utilizado de maneira inútil,as pessoas preferem mandar torpedo,falar com alguém de longe e muitas vezes ignorando aquele que está do seu lado,parecem uns parasitas.Outro dia uma amiga muito triste me disse que o filho a parabenizou pelo seu aniversário mandando uma simples mensagem, e olha só, moram na mesma casa,é claro ela esperava aquele abraço caloroso,e recebeu uma mensagem fria e sem sentimento.Sem falar aqueles que dirigem falando o tempo todo no celular, é uma perdição.É óbvio que há momentos que esse aparelho é indispensável, mas ao que vejo as pessoas estão dando mais valor a essa pecinha do que ao ser humano.
    Quanto a ser esquecido, que pena,voce e muitas pessoas certamente tem muitas histórias para contar, nas o Brasileiro só pensa em churrasco,música de péssima qualidade ( se é que podemos dizer música)e cervejinha,não estão nem ai para mais nada.
    Beijossssssssssssssss.

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